sábado, 17 de março de 2018

Os vagabundos iluminados de pinga

Osmar entrou no bar e sentou no balcão. Desabotoou um pouco a camisa e pediu uma Heineken. O balconista nem disse nada, só revirou os olhos grandes e Osmar entendeu; qualquer uma bem gelada.

Enquanto Osmar dava um gole na cerveja ruim dois maltrapilhos, um de cada lado, sentaram-se ao seu lado; opa chefe, um golinho da gelada ae, faz favor! Osmar olhou para a garrafa, ali inteira só para ele e sentiu que se dissesse não seria como negar um prato de comida a uma criança com fome - claro, Osmar piscou devagar para o balconista de cara fechada que pegou mais dois copos. Os maltrapilhos viraram os copinhos americanos como se fosse água. Ô chefe, paga uma Corote pra nóis vai, custa só um e cinquenta. Osmar olhou pro balconista de cara fechada, que confirmou a informação com um aceno de cabeça lento e pesado.

No meio da madruga, depois de muitas cervejas e cachaças ruins, Osmar juntou-se aos "vagabundos iluminados" e vagou com eles pelas ruas quase quietas e amplamente habitadas do centro da cidade. Estava tão derrotado quanto aqueles homens que acabara de conhecer, mas que entendia e em quem acreditava muito mais do que em pessoas que conhecera a vida inteira. Estava tão descolado da sua vida "real" quanto àqueles vagabundos maltrapilhos que haviam "escolhido" aquele caminho improvável. Dependentes ou não do álcool e de drogas, o "rivotril", como gostava de se referir ao trio que acabavam de formar, brigavam para falar e contavam sobrepostos suas histórias de glória e fracasso pela vida.

Osmar via em si o que aqueles homens haviam vivido: a vida farta, cheia de falhas, cheia de perdas irreparáveis, cheia de traições, decepções e derrotas. O dinheiro que vem e vai; a saúde que a gente despreza ou cuida demais, mas como qualquer coisa, falha sem aviso prévio. O amor que parte o coração, mas a gente depois nem lembra porque acumula histórias demais e a Corote derrete as memórias...

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