segunda-feira, 3 de novembro de 2014

O tempo das coisas


Às vezes me pego no limite das coisas. Me sobe um punhado de areia pelas paredes da garganta querendo eclodir um grito, mas não, ele implode, sufoca. Às vezes me pego tão alto que tenho vertigem. Custo a acreditar que cheguei aqui. Que lugar é esse? Não me reconheço. Eu era um deserto, uma estrada. Eu era um lugar remoto, pra sempre alojado na sua memória como uma bala no osso. Eu fiquei no tempo. E às vezes me pego num passo em falso, erro de compasso. E às vezes, quando me dou conta, já passou.

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

sol frio

sobre aquelas letras na parede, ele alega que é inocente.
sobre aquela cerca que se ergueu de repente, não sabe.
alega que o que vemos é o que sempre existiu, nada novo.
então por que eles olham tudo com tanta surpresa e alarde?
por que tudo arde diante de nós e os peixes se afogam?
há de restar alguma coisa real, algo além de carnal e imoral.
há de existir algo mais além de rimas tão fáceis e inocentes.
há de haver alguma inocência, um verso sem ponto final
há de haver um dia em que as palavras se bastem, se abracem,
se perdoem neste mar infinito de vírgulas e interrogações.
sobre tudo aquilo que não puderam dizer, nem explicar,
sobretudo por aquilo que viram ruir, eles agora se riem, num
riso frouxo, sonso, buscando o brilho do sol num dia frio.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

silêncio de nada

o silêncio é uma arma transparente
de aparência translúcida, imune
aos impunes e sonoros absurdos.

o silêncio é uma pluma colorida,
de cheiro doce, carregada pelo vento,
orientada pelo norte, sem saber do rumo.

o silêncio derreteu a noite de meia lua,
saiu pela rua, se esvaiu em vontades sutis,
fechou os olhos e nunca mais disse nada.

[um dia o silêncio acabou. ou será que ele nunca existiu?]