Eu desci pela rua à pé, só, prestando atenção na sombra que caminhava no
meu ritmo, imitava os meus passos e parecia mais feliz que eu, ainda que eu não
visse seu sorriso. Eu pisava devagar, tentava não fazer barulho, não atrapalhar
aquela sinfonia secreta da rua, seu som de frequência baixa, que só quem presta
atenção percebe. Eu não queria que me percebessem, que me vissem caminhar, que
seguissem minha sombra. Há na gente essa ideia de que andar pelas ruas na
madrugada não é seguro. Se não pelas coisas que não existem - e de que temos
medo - tememos pelo mal real e violento que existe; a morte iminente, inerente
à própria vida.
Eu desci a rua toda à pé, no passo firme e decidido de quem está indo,
focado, inalcançável. Tudo pode acontecer. Mas nada acontece.
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