sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

31 coisas que aprendi em 2010

#1 - Não podemos nos isolar no nosso mundinho. Nossas dores e alegrias parecem maiores porque as vemos muito de perto. Quando olhamos para os lados vemos que o mundo é muito maior do que nosso quadrado - e às vezes há que se olhar para o lado para dimensionar bem a realidade.

#2 - É difícil a gente conseguir sempre acompanhar o compasso do outro. Respeitar o próprio ritmo é necessário (na corrida, na música, na vida). Sincronia não é exatamente ter a mesma velocidade - o ponteiro longo do relógio anda mais rápido que o curto e é assim eles formam uma hora.

#3 - A gente não precisa pedir permissão para amar alguém. Basta amar. O que a gente precisa é aprender a dar a tal permissão e não esperar nada em troca por isso.

#4 - Faça a sua parte de deixe o resto simplesmente acontecer. Às vezes a gente se esquece que nem tudo depende de nós ou dos nossos desejos...

#5 - É preciso dar outra chance. E é preciso também reconhecer quando todas as chances já foram dadas.

#6 - Se tem uma coisa que não devemos economizar é na atenção. Frescura, não! Mas atenção nunca é demais. Dar atenção a alguém é mais do que ser educado. É ser generoso, amigo. Dar atenção é dar amor.

#7 - O aprendizado é uma montanha infinita*. E às vezes a gente confunde o propósito da escalada - aprender não é chegar no topo da montanha, mas justamente continuar subindo sem pensar no final dela. *foi meu pai, José Cassiano, quem me disse isso no dia do show do Paul McCartney.

#8 - A compreensão é um exercício diário, que a gente precisa praticar com todos. Especialmente com aqueles com quem temos pouca paciência - muitas vezes são essas pessoas as que mais nos querem bem.

#9 - Não somos a outra metade de ninguém, senão de nós mesmos*. Pessoas "inteiras", livres e felizes acertam mais facilmente a fórmula mágica. O amor dependente é um amor doente.
*agradeço a Maria Helena Moraes por ter me dito isso. Mudou a minha vida!

#10 - Supere-se*. Respeite seus limites, mas se achar que pode ir um pouco além, vale tentar. A gente às vezes não entende porque tem que passar por tanta coisa difícil e, tempos depois, percebe que aquilo nos deixou pessoas melhores.
*Selma Silva me disse isso e não poderia ter havido hora melhor.

#11 - O mar é capaz de ensinar num único dia lições que não conseguimos aprender numa vida inteira. Lições que mudam a nossa vida. Mas há que se prestar atenção, senão é só mais um dia no mar.

#12 - Há tempo de sorrir e há tempo de chorar. E é muito bom poder fazer as duas coisas quando se tem vontade. Sem vergonha, sem pudores, sendo verdadeiro com o que a gente sente e com as pessoas que estão à nossa volta.

#13 - Temos que fazer aquilo que nos dá vontade, sim. Mas medir o risco e recuar se for necessário pode não ser muito divertido, mas poupa tanta dor de cabeça... A regra é simples: a viagem vale o esforço?

#14 - Quem disse que a gente tem que ser coerente o tempo todo? Prefiro ser essa metamorfose ambulante!*
*Frase de Raul Seixas, que todo mundo conhece e pouca gente entende.

#15 - O maior erro que podemos cometer é ter medo de errar. Errar é acertar em etapas.

#16 - Não podemos esperar que todos nos entendam, nem que nos perdoem ou aceitem nossas decisões. É triste quando acontece com alguém de quem gostamos muito, mas é muito melhor agir com verdade e não fingir que nada aconteceu. Pedir perdão faz bem. E entender (e aceitar) quando não podem nos perdoar faz bem também.

#17 - Não deixe as coisas para depois. Algumas oportunidades não vêm mais do mesmo jeito. E com o passar do tempo, pensamos que teremos mais tempo, mais dinheiro, mas isso não é necessariamente verdade*.
*Henrique Romero, meu dupla “oficial”, pedaço de mim, me disse isso num momento de muita distância e saudade, quando nos demos conta de todas as coisas boas que já vivemos juntos.

#18 - Veja o dia passar. Observe as coisas de perto; aquelas nas quais você nunca repara. Há uma beleza surpreendente nas coisas mais simples... e elas trazem uma satisfação enorme.

#19 - Permita-se falhar. Você é humano, afinal. Permita-se agir por instinto. Você é bicho também, é bom não esquecer.

#20 - É bom ouvir as pessoas que nos são importantes. É incrível como elas costumam fazer uma imagem nossa bem diferente daquela que temos sobre nós mesmos. Isso às vezes é chocante, mas nos provoca sair da perigosa zona de conforto.

#21 - A gente muda, SIM. Todos os dias, às vezes rápida, às vezes lentamente. Fique atento: você está se transformando em alguém que você gosta de ser?

#22 - Abra espaço para o novo. Não colecione coisas nem pessoas que não te fazem mais diferença* - despeça-se deles, agradeça pela passagem em sua vida, mas siga em frente sem apego, porque o que realmente importa não podemos possuir.
*refletindo sobre a vida com a ajuda do Marcelo Freitas outro dia falamos sobre isso e várias fichas caíram. Valeu, presidente!

#23 - Assim como nós, a natureza é simples mas complexa: nuvens não são esferas, montanhas não são cones, litorais não são círculos, a casca das árvores não é lisa, assim como o raio não viaja em linha reta. Todas essas formas são fractais.*
*Obrigada Fabio Cripa por mandar a explicação sobre os fractais de Benoît B. Mandelbrot. Antes eu achava que fractais eram apenas imagens lisérgicas.

#24 - O ócio pode ser divertido se o usamos como um espaço potencial onde qualquer coisa pode acontecer. Tédio é coisa de gente que tem preguiça de pensar.

#25 - Não há mal que sempre dure... Quando paramos de remoer e deixamos para trás memórias que nos causam dor, ficamos mais leves e prontos para receber o que nos faz bem.

#26 - Regras são referências, assim como consequências.

#27 - Medos são limites e é bom respeitá-los. Só não deixe que eles te impeçam de fazer as coisas que você tem vontade.

#28- As grandes oportunidades normalmente estão onde menos esperamos. Mas temos que estar abertos para que elas nos encontre.

#29 - Ninguém quer ter o coração partido. Mas se você pensar, faz bem pois te coloca em contato com emoções raras e te faz descobrir forças que você nem sabia que tinha. Tudo na vida tem seu valor; até o desamor.

#30 – Contar nossas histórias é bacana. Compartilhar às vezes espalha mais coisas boas do que podemos supor.

#31 - 2010 foi um ano de encontros, reencontros e desencontros – todas experiências muito ricas. E me dei conta de que sou mesmo feliz quando vivo plenamente o PRESENTE. Mas somos feitos da nossa história então pensar no passado faz parte. Usemos isso, pois, para nos preparar para o presente e nos fortalecer para o futuro, pois é pra lá que todos vamos. Feliz dia 31! Feliz HOJE! E um lindo 2011 para vocês.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Palavras tentativas

Numa madrugada estrangeira as ruas parecem perdidas, os rostos parecem distantes, as memórias esquecidas, os ruídos abafados. Mas o coração, que deveria estar acelerado, está lento. Dividido entre os efeitos do novo controverso e o velho já sabido - e sofrido, desgastado, mal quisto, cansado, exagerado, reprimido e pseudo sublimado. Desistimos da verdade, da clareza, da presença das palavras faladas. Sobraram as palavras escritas. Essas mesmas que nunca faltam. Essas mesmas que, por mais que tentem, não dizem nada.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

2010, o ano do futuro, do presente e da história

Eu achava que 2010 era um ano a anos-luz de mim. Nasci na década de 70. Cresci ouvindo Ziggy Stardust e vendo 2001: uma odisséia no espaço (que meu pai tinha em VHS, gravado da TV, em sua pequena e poderosa videoteca – num tempo em que não havia essa coisa de coleções inteiras de clássicos do cinema como brinde de assinatura de jornal). Nos anos 80, quando já não havia mais Elvis, Lennon e Elis Regina – e o mundo ficou estranhamente mais triste, violento e com umas modas de roupas, drogas, música e até literatura muito duvidosas – foi quando comecei a entender melhor como as coisas funcionavam. Mas ainda não existia computador assim, como uma coisa comum em todos os lugares, como vemos hoje. Internet? Telefone celular? Caixa eletrônico? Gente, nos anos 80 havia coisas incríveis e muita diversão, mas a gente mandava cartas, telegrama e mal existia o fax! Então, pensar no mundo de 2010 parecia uma coisa muito distante, outro século, uma coisa do futuro! Nos anos 90 a coisa começou a pegar para mim. Era muita informação, muito hormônio, muita gente, muita referência, muita coisa nova, muita gente me dizendo o que fazer e eu muito certa de que tinha certeza de tudo, menos do que me mandavam fazer. E mesmo com essa confusão toda, de algum modo as coisas foram se ajeitando e os anos 90 me pareceram passar meio lentamente. O ano de 2010 ainda parecia uma coisa muito distante, ainda muito num futuro que eu imaginava, graças ao cinema e à velocidade com que as coisas aconteciam na tecnologia e comunicação, uma coisa muito futurista. Sabe aquela imagem das pessoas todas usando uma roupa prateada? Pois é. Eu imaginava as pessoas ficando cada vez mais iguais, cada vez mais idiotas e produzidas em série. Putz, os anos 90 foram compridos... até a contagem regressiva pro milênio foi lenta. E até um pouco decepcionante, visto que estavam todos esperando pelo bug do milênio e ele não aconteceu. E entramos nos anos 2000 assim, cautelosos, achando que estava tudo bem e de repente foi como chegar ao topo da primeira descida da montanha-russa – aquela maior de todas, quando temos pela primeira vez aquela sensação de velocidade desenfreada, um vento violento na cara, o estômago descolando do lugar, a ausência da gravidade e aquele sentimento alucinante de queda livre – e de repente todos tinham não só celular e computador, mas também estavam todos conectados, 24 horas no ar, 7 dias por semana, por sms, skype, trocando fotos, gostos, experiências pessoais de maneira aberta e quase irrestrita. Tudo aconteceu muito rápido nos anos 2000. Não sei se foi coincidência da era da tecnologia e conhecimento com o momento da minha vida, mas nos anos 2000 nunca estive em tantos lugares e nem conheci tantas pessoas e me conectei e mantive contato com elas como dessa época em diante. E enquanto 2010 vinha chegando numa velocidade vertiginosa, as coisas também iam mudando na minha vida de maneira vertiginosa. Experimentei empregos novos, conheci outros mercados, outros costumes, outras línguas, experimentei ficar junto, ficar só, jogar “tudo” pro alto e vários outros significados para “tudo”. Em 2008 eu me lembro de ter literalmente visto o ano passar por mim e transformar-se em 2009, nas areias de Copacabana, um momento tão clichê e popular que eu não imaginava que poderia ser o maior momento de comunhão que eu já havia visto na vida, ali, materializado em centenas e centenas de pessoas vestidas de branco, indo buscar no mar uma coisa que ninguém sabe explicar direito, mas que funciona como uma espécie de bênção, um beijo da mãe, como a nos dizer “vai, filho, vai ser feliz”. Aí eu entendi melhor essa necessidade que temos em querer cortar o tempo. É importante mesmo. É como uma pausa necessária para respirar, tomar fôlego. E aí sair correndo de novo porque correr é muito divertido, mesmo que nem sempre a gente consiga acompanhar o ritmo do outro ou fazer com que acompanhem nosso ritmo. E quando eu menos esperava, me dei conta: estamos chegando ao final da corrida de 2010. E 2010 não foi exatamente um ano futurista. As pessoas não estão todas iguais, de roupa prateada. Bem, algumas até estão, mas até isso dá diversidade ao momento. Ao contrário do que eu imaginava, as coisas não estão muito mais organizadas nem exatamente melhoradas, mas pelo menos temos cada vez mais conhecimento, mais acesso, mais instrumentos. E ao contrário do que eu imaginei também, as pessoas não estão se imbecializando. Sempre vai haver as que estão, mas há tanta gente legal, tanta gente boa e bem intencionada, buscando fazer coisas para evoluir. Me dei conta do quanto sou arrogante por subestimar as pessoas. E do quanto sou feliz por ter quem me mostre isso e me ensine que todos temos coisas boas e ruins dentro de nós – e o que importa é o que você faz com isso. Refletindo sobre achar que 2010 era um ano distante e dele ter chegado assim, “repentinamente”, me dei conta de que ao final de cada década, ao final de cada ano, aquele foi o momento mais importante da minha vida, porque paro para pensar nessas coisas todas que já me aconteceram. E vejo que as pessoas à minha volta são as mais importantes do mundo, porque sem elas não há história para contar, não há nada. Mesmo que a cada ano sejam pessoas diferentes. Porque nos momentos em que estamos sós – importantes momentos para também pensarmos por nós mesmos, refletirmos um pouco sem a influência do resto, mas apenas ouvindo e sentindo o que vem da nossa própria alma –, estar só não será uma coisa solitária e triste porque temos em quem pensar, porque nos lembramos da história que só é possível escrever a muitas mãos. Por isso que eu sempre digo que é muito bom poder ter companhia até para estar sozinho. E me dou conta de como é bom encerrar cada ano com pessoas especiais, mesmo que eu não esteja com elas no zerar do cronômetro, elas estarão comigo e eu abraçarei em pensamento cada uma, com aquele abraço apertado que vocês sabem que eu tenho (ou podem facilmente imaginar), e vou desejar com toda a força que existe em mim que cada um seja feliz. Dizem que o que mais importa é ter saúde. É verdade, mas de nada adianta estar saudável e infeliz – acho até que estas são duas coisas antagônicas... – e já conheci muita gente doente e feliz, que me ensinou que a gente é mais do que um pedaço de carne, mais do que uma máquina poderosa onde tudo tem que funcionar perfeitamente bem para que a gente fique em pé todos os dias e leve uma vida “normal”. Então, meus amigos de agora e de sempre, novos, velhos, virtuais, viscerais, superficiais, daqui e de todo lugar, confesso a vocês que 2010 chegou pra mim lentamente e acabou muito rápido. Tão rápido que eu confesso que não sei bem o que esperar de 2011. Concluo mais esta década da vida achando que esse nosso mundo é muito bom, embora tão maltratado. Concluo mais este ano agradecendo por ser feliz e por conseguir entender que a felicidade é uma coisa efêmera e que tem que ser conquistada com empenho, todos os dias. Para 2011 desejo a todos o que desejo também para mim: coisas simples como beijos, abraços, sorrisos, banho de mar, comida gostosa, música boa, sono tranquilo, paz de espírito. Pensei em mandar esta mensagem apenas para meus amigos mais próximos, mas refletindo mais uma vez sobre o quanto 2010 demorou para chegar e o quanto sua chegada surpreendente virou o mundo de cabeça para baixo e mudou completamente nossa relação com as pessoas e a comunicação com elas, resolvi publicar o texto aqui e convidar quem quisesse a cumprir o desafio de ler esse texto longo e talvez até desinteressante, visto que não é literatura, crônica, novela, propaganda, post nem nada além do que minhas impressões sobre o tempo. Se você está feliz com sua jornada até 2010 e está refletindo sobre como será 2011, talvez possa ter gostado de viajar nas suas experiências enquanto lia sobre as minhas. Obrigada pela companhia e seja bem vindo a mais um ano da nossa história.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Jogos de azar [fucking loosing games]

Quando me arrependi do que não fiz, do que não disse, já era tarde. Já não faria mais efeito. Quando desisti, achei que tinha mesmo desistido, mas venci minha própria resistência. Desistir não foi mais opção. Então fiz de novo, disse de novo, do modo como pude, joguei com as cartas boas que tinha na mão. Eram boas cartas. Mas para ganhar o jogo, não bastam as cartas serem boas; elas têm que combinar entre si. Perdi outra vez. Mas agora sem arrependimentos.

[There's no sorrow. There's only bad results. And it has been a while since I have bet in a freaking right game.]

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Dia cheio

Me pego enroscada neste dia comprido. Fui de um extremo à outro no que sinto, no que penso. Tive vontade de chorar, de rir, de gritar. E fiz todas as coisas na ordem que quis. Há um efeito lunar nisso tudo. A lua gigante ali na janela estica o dia, resistente em acabar. É o fim não apenas de um dia. É o fim de uma série de coisas, de uma estação do ano, de uma volta nova e completa do planeta, da lua, do sol. O dia não acaba porque ainda estamos aqui, enroscados na primavera pegajosa, resistentes ao verão de calor cruel, hipnotizados pela lua cheia e seus efeitos delirantes sobre as marés lá longe a encher ou aqui dentro a vazar. O dia já acabou. E já começou tudo outra vez.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Na madrugada

A lua, cheia como eu, imprecisa. As nuvens, caleidoscópio do céu, misturando as cores de nossas vidas que ora formam uma coisa, ora formam outra. Partidas, tumulto, silêncio, lembranças do que estamos ainda fazendo.

Momentos de sorte

Por vezes não temos chances. E de vez em quando temos chances demais. Coleciono momentos perdidos. Aqueles com o cenário e personagens perfeitos, desperdiçados na falta de coragem para falar, para agir. E então resolvo que é hora de uma coleção nova. Momentos aproveitados de uma extremidade à outra. Muitos olás. Muitas despedidas. Muitas risadas e muitas lágrimas também. Somos todos humanos, afinal. Mais sorte que juízo.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Início, meio e fim

Somos espécies diferentes. Operamos por lógicas paralelas. Poderosas quando desviam e se cruzam. Mas a vida às vezes precisa de roteiro. Não pode correr à esmo, senão não dá em lugar algum. Senão acaba no ponto sem saída do labirinto, ponto cego do espelho, ponto morto da marcha, que não sai do lugar, que não vê ninguém além do que não precisa, que não dá em lugar algum. Mas somos espécies diferentes, então o que pra mim é o fim, de repente pra você é só o começo.

Sutilezas da fome

Um amigo do trabalho os apresentou. Ele era comprometido, ela não. Mas ela era encantadora. Ele, não. Mesmo assim havia algo nele que mexia com ela. Conheceram-se, aliás, enroscaram-se primeiro, meio sem critérios, por acaso, num momento de loucura quando - acharam - repentinamente não havia mais ninguém prestando atenção. Ela sabia que seria complicado. E mesmo assim não se importou. Mas ele gostou da complicação. Voltou, quis mais, insistiu. Ela resistiu, mas estava pronta para ceder. Seduziam-se em emails, mensagens, jogos de coincidências que o destino - e não eles, incrivelmente, mas o destino! - lhes jogava no colo. Viam-se pouco, mas quando viam-se compartilhavam gostos e coisas e referências que faziam-se surpreender. E a total ausência de intimidade compensava-se com a liberdade que sentiam um com o outro. Uma liberdade até descontrolada, meio lasciva, de entrega fácil e ruidosa. Mas era pouco. Para ambos. Um queria mais e não podia ter. O outro queria mais, mas tinha medo de ter e não saber o que fazer com aquilo. E ficavam reticentes em insistir. E tentavam ser sutis um com o outro. Queriam-se, mas sutilmente não encaixavam-se - uma afronta ferina para a fome que sentiam um pelo outro, distraída pelo excesso de cheiros e saciedade momentânea.

Basta

Você vai embora e me lembro do que não fizemos. Me lembro do que queremos. E tememos. E tememos nunca mais ter, nem nunca mais querer assim. E me dou conta que às vezes quero demais. E isso me basta.

Vejamos

Eventualmente, te vejo. Eventualmente te beijo. Eventualmente te quero. Eventualmente te espero. E espero que as eventualidades não se confundam com as fatalidades. Vejamos como a história continua. Não há eventualidade para os eventos da vida - ou é só isso que a vida é? um conjunto de eventualidades? Vejamos...

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Refém

Não me é opção. Está por toda parte. E parte. E não volta. E ainda continua aqui.

Iguais

Será que perdemos o prazo? Será que perdemos só tempo? Será que em algum momento o que vimos acontecer não se anunciou? E o que poderia ser diferente se o resto do mundo é e nós simplesmente não somos?

Sentido insensato

Sou sensível ao belo e ao harmônico. Me emociono diante do que é delicado. Talvez porque more na delicadeza um poder desconhecido e verdadeiro que age com muita suavidade. Há beleza nas coisas mais prosaicas. E somos tão insensatos que só notamos quando alguém aponta.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Novos volumes

Acho que a vida vem em volumes. E numa página em branco você pode brincar, rabiscar, apagar, s-o-l-e-t-r-a-r bem devagar... ou acelerar e encerrar! dramaticamente. E aí não importa muito em qual volume estamos nem como vai terminar. Estamos escrevendo. E talvez seja melhor assim, desordenado mesmo, ora na minha língua, ora na nossa. Em muitos volumes se assim for preciso. Numa única página, se isso bastar.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Ruídos

Existem ruídos que me lembram você. Não tinha reparado antes. Antes eram músicas, imagens, momentos que me lembravam você ou alguma coisa que estivéssemos fazendo que escapa lá do arquivo morto da minha memória e corre para a frente dos meus olhos ou ouvidos como a me provocar, em tom de escárnio, relembrando o quanto ainda preciso de todo um universo novo para que essas coisas não me assombrem mais. Mas os ruídos, não. Acabo de me dar conta. Os ruídos nunca vão se dispersar. Bem típico de você: roubar-me até os ruídos.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Volumes

Abri o caderno ao meio e comecei a escrever assim, sem me preocupar em haver uma primeira página. Abri o caderno ao meio como se ele fosse minha vida, cheia de páginas brancas ainda, para frente e para trás. Como se eu estivesse agora num caderno novo dentro desta vida ainda. Como se os cadernos já escritos fossem conectados a ela mas, de algum modo, escritos em outros tempos, de outras formas, com lógicas diferentes. Não deixa de ser interessante encarar as coisas assim: vários volumes de vida. O volume 1 escrito a muitas mãos, menos as suas. E a partir do volume 2 com a narrativa em primeira pessoa. E noutro volume com emoções desrespeitando as pessoas, as orações, as narrativas, a divisão de volumes... Numa hora os volumes são poucos. Ou têm poucas palavras. E no momento seguinte já são muitos, volumosos, pesados, com variações mil de gêneros, estilos, tempos verbais e até idiomas... Vou lá de vez em quando, consultar os primeiros cadernos, beber um pouquinho da história que há neles, testemunhas e atestados do que sou. E volto para este último, começado há pouco, displicentemente numa página bem no meio do volume e me agrada não saber se vou passar para a página seguinte ou a anterior. A gente não muda os volumes anteriores, nem as páginas já escritas. E nada disso importa quando a página está em branco ou recém preenchida, porque aí você pode brincar. Pode ir para a frente e pode voltar um pouquinho, trocar as palavras, ajustar o texto, mudar um pouco a linguagem, variar os personagens... começar de um jeito e terminar de outro. Não importa qual é o volume em que estamos, nem como ele vai terminar. O que importa é que estamos escrevendo. E acho que eu gosto mais assim, desordenado mesmo, ora na minha língua, ora na nossa. Em muitos volumes se assim for preciso. Numa única página, se isso bastar.

Não responda

Pensei em milhares de palavras. E em rimas, desculpas, motivos, sinônimos, absurdos, coisas contraditórias. Pensei nos passos que me trouxeram até aqui e porque de repente não era aqui que eu queria estar. Pensei então em todas as perguntas que eu queria fazer. E em todas as que eu fiz e não houve eco. Pensei em diversas respostas possíveis. Mas assim como as respostas que você não me deu, seus motivos também são apenas seus.

Just for now

So I was thinking about the past. About what we've did. I was thinking how empty we can feel and how full life can be. But for now I just wanted not think about it. Just for now I wish you out of me. Just have no room for anything else...

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Mal olhado

Aos seus olhos, tudo bem. Mas meus olhos não podem. Eles dizem sim quando minha boca diz que não, contrariando meu corpo inteiro. Aos seus olhos, poderia ser. Mas meus olhos enxergam mais do que eu gostaria de ver e me proíbem que eu os feche como da primeira vez. Seus olhos são escuros. Os meus, borrados. Meus olhos são puros. Os seus, malvados.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Se você quiser

Não sou esta mulher que chama a atenção na rua. Mas se você quiser, posso ser.
Não visto roupas provocantes, não faço cabeças girarem para me sentir olhada. Não sou assim... mas se você quiser, posso ser.
Não sou quieta, não contenho muito bem as palavras. Não sou muito paciente. Mas se você quiser, posso ser.
Não gosto de novela, não creio em príncipe encantado, não sou princesa de ninguém. Mas se você quiser, posso ser.
Não sou uma sonhadora tradicional. Sonho com o banal. Não sei se posso ser parte dos seus sonhos. Mas se você quiser, posso ser.
Não sei muito sobre me dedicar a uma coisa só. Nem sei se tenho esse talento, se será difícil ser dedicada assim. Mas se você quiser, posso ser.
Não vou a lugares que não quero, não gosto de quem não merece, não sou muito tolerante... Mas se você quiser, posso ser.
Nunca fui o que não quis. Nunca tentei ser diferente. Sou apenas o que sou. Mas se você quiser que eu seja mais, posso ser.
Para me ter você precisa apenas querer. Posso ser o que você quiser. Você precisa apenas me dizer – posso ser?
Eu poderia ser qualquer coisa. Inclusive o que você quer. Então apenas me diga se um dia você quiser.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Ridículo

O amor é uma coisa ridícula. Pense bem: a gente passa mal, se descabela, chora porque não tem, aí quando tem chora porque não quer mais... e passa mal e se descabela de novo. É como um porre de tequila - você sabe que vai dar naquela ressaca animal amanhã, mas continua bebendo só porque é tão bom... e no dia seguinte jura para todos os santos, orixás e entidades que nunca mais vai beber álcool na vida. Até a próxima. Claro, porque na próxima você vai lembrar, antes mesmo de tudo começar, como somos ridículos. Vai olhar de novo para aquela porta fechada e pequena e calcular - hmmm, será que eu passo ali? Preocupação estúpida se a porta ainda nem estiver aberta. Mas a gente se esquece desses detalhes. Aquela mera possibilidade de alguma coisa nova ali, um cheiro um pouco diferente no ar, uma brisa morna que sopra de repente e pronto - estamos de novo virando a página do calendário, mudando de estação. - E a gente se esquece também que nem todo verão é quente e úmido. Se esquece que tem um monte de coisas que a gente já sabe, mas outro monte de coisas que a gente não faz a menor ideia. E aí temos medo. E de repente não temos mais e tudo começa ficar tão divertido outra vez. As pecinhas do quebra-cabeças começam a aparecer e se encaixar uma na outra e a gente se surpreende de novo e esquece que as peças nasceram todas juntas e se separaram depois para que a brincadeira pudesse existir. Mas uma peça de quebra-cabeças nunca tem um encaixe só. E todo mundo sabe que os melhores quebra-cabeças têm mais de mil peças. Tem hora que a gente cansa de montar e se esquece - a gente vive se esquecendo - que não precisa montar tudo de uma vez. O segredo é achar a peça certa e enquanto isso ir divertindo-se com as erradas - divertindo-se com as tentativas de encaixar. Agora me diga: tem coisa mais ridícula que juntar pecinhas infames para montar uma imagem que você já sabe mais ou menos o que vai ser depois? Ou seja, tem coisa mais ridícula que montar quebra-cabeças? Agora me diga, só mais essa vez: tem coisa mais ridícula que o amor? E mesmo assim eu amo quebra-cabeças...

Dezembro ao norte

Dezembro é uma ampulheta com muita areia caindo. Uma curta contagem regressiva para tantas coisas quanto se pode caber dentro de um ano inteiro. Queremos passar por ele rápido, como se fosse apenas uma conexão, uma paradinha em excessos de qualquer coisa - até de afeto. Sobra muita coisa em dezembro - coisas não cumpridas, não resolvidas. E a gente se absolve diante da oportunidade ali, zerando o cronômetro. Mas cortar o tempo é bobagem. A gente se esconde no tempo só porque ele parece resolver as coisas. Não é verdade: quem resolve as coisas não é o tempo. O tempo é só um recurso, um transporte. Um mero norte.

Volta incerta

Voltou-se para dentro. Era hora de sorrir só. Seu fuso horário estava desajustado, seu relógio quebrado... alguma coisa não fazia sentido. Mas tão poucas coisas faziam sentido ultimamente. Pensava no tempo passado – e pensava se não soaria melhor usar o presente, mas desistia porque já estava tudo começado e não ia fazer o caminho todo de novo. Pensava no passado, mas só há poucas horas havia percebido que era hora de voltar-se para dentro como estava querendo. Havia um excesso de querer por toda parte. Todos querendo ser livres, querendo ser loucos, querendo ter menos experiência para não privarem-se de novas experiências. Quando aquilo tudo tinha começado? De repente as coisas não seguiam mais em linha reta. De repente estava todo mundo torto. De repente as respostas não estavam mais nos outros. Então era hora de voltar-se para dentro. Algumas questões a gente só responde assim, quieto.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Vou deixar

Deixei você me amar. Me mimar. Me encher de beijos, cortejos, carinhos, nominhos. Deixei você gostar. Me cuidar. Me deixar. Me deixei levar. Gostei de deixar. É bom deixar, permitir, sentir o que você quis me dar. Deixar é bom. É flutuar à deriva se o mar está calmo e o dia bonito. E você me olhando. E eu deixando.

Nothingness

So there is love
And there is hate
There is luck
And there is fate

There is you
And there is me
And there is nothing
When we can't be

sábado, 4 de dezembro de 2010

Volta lenta

A rede está lenta. Minha vida, sonolenta. O vento está forte. E você, sem sorte. Eu volto, você vai embora. Eu volto para dentro. Você, para fora.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Um, dois

Somos um. Bem mais que dois. Sou um, mas não sou nada. E você aí, ninguém também, é bem melhor em mim. Somos dois, mas somos bem melhor quando somos um.

Para quando você for embora

Há memórias que me escapam, coisas que só me lembro depois, juntando os pedaços. Você e sua memória incrível se riem, reconstróem o passado mais rápido que eu. E o que eu posso dizer? Tenho meu próprio tempo para lidar com o tempo. Você não entende. Vai embora descontente. Não me espera. Me escapa como as memórias que só me aparecem depois, quando não preciso mais delas. Tudo bem. Não leia isso agora, não pense em nada agora. A gente já sabe como acaba. Então guarde para quando você for embora.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Enquanto escovo os dentes



Você foi embora e deixou aqui sua escova de dentes. Ela ficou ali, como a me lembrar de um modo meio sarcástico que você foi embora. Memória insistente de algo que eu preferia já ter esquecido. Mas não posso. A escova está ali e eu deveria jogá-la fora. E penso que talvez ainda não seja a hora. E me pergunto - ué, por que não? E mesmo não tendo respostas, ela continua ali, a me afrontar. Me questiono se não estou me torturando. Usando aquela escova indiferente à sua ausência como argumento fajuto para que eu resista à tentação de te esquecer. Seria tão mais fácil... Acordar amanhã livre dessa memória estúpida, que não nos serve mais de nada. Afinal, você foi embora e não houve nada que eu pudesse fazer para que você ficasse. E não há nada que eu possa fazer para que você volte. Me pego pensando se haveria algo. Juro. Não desisti assim de cara. Mas não vejo como. Você quis ir. Resolveu. Comunicou. Partiu. Eu permiti. Não disse palavra. Vi você partir da minha casa e da minha vida, sem nem me pedir permissão. Não entendi porque você foi e também não questionei... não pensei em pedir - fica. Não pedi. Não soube como. Não consegui dizer. E sua escova de dentes segue aqui, todos os dias a assombrar minha rotina manca, torta, desequilibrada sem você nela. Todos os dias eu penso em jogá-la fora. Mas não jogo, como se isso fosse a esperança de que você pode voltar - e então eu diria, orgulhoso: olha só, sua escova continuou aí, junto da minha. E então me convenço de que estou me enganando, ganhando tempo para distrair minha tristeza e sublimar meu orgulho ou minha falta de timing - por que diabos eu não te disse para ficar? Pensei em te ligar para falar da escova. Mas o motivo me pareceu tão idiota... E o que mais eu poderia dizer? Que a primeira coisa que eu faço quando abro os olhos é perceber que você não está? Que quando abro a geladeira e tudo balança não me lembro de você ter dito tantas vezes que a geladeira precisa de um calço? Que quando coloco a música muito alta não lembro de você abrindo a janela da sala para que ela não ficasse vibrando? Ai, quantas coisas mais eu poderia te dizer nessa ligação? Que me falta tua boca? Tua pele, tuas mãos nas minhas... teus cabelos... que me falta você? Que penso em tudo isso enquanto escovo os dentes só porque sua escova está ali, junto da minha...?